Memórias Pessoais do Tio Padre

 
Todos nós que tivemos o previlégio de não só conhecer mas conviver com o Tio Padre ficamos, sem duvida, com recordações inesqueciveis dele.
Quando penso nele penso logo na sua bondade, na sua simplicidade, na sua vida eclesiástica.
Um homem que viveu o que pregava, um verdadeiro Homem da Igreja.
Ao falar dele, digo muita vez que se há santos, ele é decerto um deles. 
Mas para mim ele era simplesmento o "Tio Padre".
Lembro-me da minha mãe contar que quando ele vinha à cidade na camioneta e não tinha ocasião de parar em nossa casa,
quando a camioneta passava pela nossa porta e ele estava sentado no lado da camioneta onde a minha mãe e avó
estavam à janela (o que acontecia muito),

ele cobria a cara com a sua pasta para que elas não o vissem e ficassem ofendidas.
E por falar na sua pasta .... tinha um cheiro muito especial que mesmo hoje em dia 
quando o sinto é como se estivesse ao pé dele.
E os muitos dias que passei em casa dele acompanhando a minha avó Estrêla, a sua irmãe. 
Belos tempos. 
Estou-me a ver sentado na sua cadeira com almofadas azuis no seu escritório a trabalhar e a conversar.
 Estou a vê-lo sentado à mesa e quase sempre vinha a Missã (?) dizer que estava alguém à porta a perguntar se
 o Senhor Prior queria comprar peixe, 

o que ele fazia quase sempre para ajudar esse home. 
Vivia para ajudar os menos favorecidos.
Que belos tempos passei no Passal, especialmente durante as vindimas e na altura do Presépio.
Tanta vez que eu dei à manivela para movimentar o Presépio.

E sempre que nos via, à escondida, dava-nos sempre "um dinheirinho", e .... estou a ver a minha avó tentando que ele não o
fisesse e dizendo "Padre Evaristo, não,... eles não precisam."

Recordo-me sobretudo dum incidente que aconteceu durante umas das festas na Ribeira Grande. 
Eu estava à janela com a minha avó a ver o grande movimento na rua quando de repente vimos que qualquer coisa anormal tinha acontecido em frente de nós, no passeio onde haviam vários comerciantes a vender várias coisas. De repente vimos várias pessoas com pilhas (era já noite) que andavam à procura de qualquer coisa. 
De manhã quando eu sai de casa reparei que haviam muitas moedas no chão, na mesma área onde na noite anterior isso tinha acontecido. Para mim, foi como se tivesse encontrado um tesouro! 
Juntei todos as moedas e depois fui mostra-las à minha avó e ao Tio Padre. 
Ele olhou para mim com o seu sorriso gentil usual e disse-me:" Sabes, este dinheiro não é teu, e não sabemos a quem pertence.
 O que deves fazer é ir à igreja e meter este dinheiro na caixa dos pobres." Claro que obedeci ao Tio Padre, ... mas não muito satisfeito. Quando voltei da igreja, ele veio ter comigo e meigamente estendeu a mão e disse " Pega, isto é para ti." Quando abri a mão ... ele tinha me dado a mesma quantia de dinheiro que eu tinha achado. Sem me dar grandes explicações ele ensinou-me uma lição que eu nunca mais esqueci. Mesmo sendo criança foi uma lição que eu aprendi e que me mostrou que tipo de pessoa ele era. 

Uma de muitas preciosa memórias que tenho dele.

João Pedro Borges de Sousa


 
Eu tenho só uma recordação do tio Padre.
 Eu tinha só 4 anos e meio mas lembro-me muito bem de ele vir nos visitar à Lagoa
 e como sempre dava-nos uns trocos e neste dia ele ofereceu-me uma estampa (santinho) de Santa Cecilia
 (que ainda o tenho guardado) e disse-me que Ela ere a padroeira de Musica e eu fiquei muito contente
 porque até hoje sempre gostei muito de musica. Lembro-me tambem da Missão assim como do Passal.
 Tenho uma vaga ideia de ver o presépio na Ribeira Grande mas acho que ele já tinha falecido.

Maria Cecilia Gouveia Andrade 


 
Estamos à mesa, a campainha da porta toca.....
A "Missã" diz ao tio padre:
"O homen do peixe está à porta mas agente não precisa de peixe...”
      E o tio padre diz....
“Compra tudo o que ele tiver pois ele precisa de ir para casa para a sua familia....”

    Eu nunca vi o tio padre fumar mas ele muitas vezes dava-me dinheiro para ir comprar um maço de cigarros.
Nunca me esqueço: Danilos com uma "boquilha" de cera.... (não havia filtros nessa altura).
Eu dava os cigarros ao tio padre e o troco..... e ele dava -me o troco.

Avó Estrêla algumas vezes via e dizia "ele não precisa...."
Nessa altura ou mais tarde ...o troco vinha sempre parar às minhas mãos..... com um tipico sorrizinho.

   Ao fim de cada refeição o tio padre mastigava uma pastilha de carvão para ajudar à digestão ......
Ele depois mostrava a lingua toda preta e ria-se com a nossas caras de espanto.

Luis Alberto Borges de Sousa


 
Certo dia perguntei ao Tio Padre Evaristo se era pecado pintar os lábios.
Ele respondeu-me que não era pecado, pois tratava-se de avivar os Dons da Natureza.

Natividade Amaral Silveira